Clube dos Loucos
Textos, histórias, desabafos, notas, bobagens e coisas sem sentido de Alessandro Mendes, o patriarca do Clube dos Loucos. Desde junho de 2009, a menina do clube, Iara Vidal - mulher do Alê, mãe do Iuri, do Arthur e do Pedro e dona da Kira e da Bela - também passou a colaborar com a produção dos textos.
17 julho 2006
10 julho 2006
Aventura para contar aos outros
Uma das melhores experiências profissionais que tive na vida foi uma expedição que a Gazeta Mercantil promoveu durante mais de 50 dias por todos os estados do Centro-Oeste. Cinco duplas de repórteres se revezaram ao volante de um Troller em busca de pautas que mostrassem um pouco da economia das cidades mais importantes da região. Minha parceira foi a Jaqueline Dias, hoje dona de uma empresa de comunicação. Em 10 dias, visitamos duas cidades do Mato Grosso (Cuiabá e Rondonópolis) e sete do Mato Grosso do Sul (Coxim, Aquidauana, Miranda, Corumbá, Bonito, Dourados e Campo Grande).
A história mais interessante da viagem aconteceu já no final, quando estávamos indo de Corumbá a Bonito. Tínhamos passado há cerca de uma hora por Bodoquena e estávamos a mais ou menos 50 quilômetros de Bonito. Como as condições da estrada, que era de terra, eram péssimas, levaríamos pelo menos mais uma hora para chegar. O negócio era viajar com calma, admirando a paisagem e o horizonte a perder de vista.
Do nada começamos a ouvir um barulho esquisito:
TSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
Pensei na hora: será que furou o pneu? Desci do carro e fui checar. Tudo ok. Voltei para o Troller, sentei no banco e girei a chave. Nada. Girei de novo. Nada. Outra vez. Nada. Nem sinal. Nem barulho. O carro não funcionava de jeito nenhum.
E agora, o que fazer? Estávamos no meio do nada, não tinha uma alma viva perto, só fazenda para todos os lados. O carro estava cheio de coisas, toda nossa bagagem, dois notebooks, dinheiro etc. E como a parte elétrica não estava funcionando, era impossível fechar o vidro. Ou seja, não dava para largar o carro e procurar ajuda. Celular, evidentemente, nem pensar: zero de sinal.
“E então Jaqueline, você fica aqui e eu vou procurar ajuda em alguma fazenda”, sugeri.
“De jeito nenhum que eu fico aqui sozinha”.
Bom, tínhamos um impasse. Mas durou pouco. Por sorte, passou um ônibus indo para Bonito. Jaqueline pegou uma carona até a porteira da fazenda mais próxima. Enquanto ela ia procurar ajuda, resolvi mexer no motor do Troller. Não entendo nada de mecânica, mas sei lá, poderia ter algum cabo solto ou poderia dar sorte e mexer no lugar certo... Uns 30 minutos depois escuto o barulho do motor:
VRUMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
Fecho o capô, entro no carro e vou em direção à fazenda mais próxima. No caminho, vejo a Jaqueline voltando, de carona em um trator que vinha nos rebocar. Paro ao lado, sem desligar o motor. O trator estaciona no canto. Conversamos uns cinco minutos com o funcionário da fazenda. Ele sobe no trator. Liga a chave. Nada. Liga de novo. Nada. Outra vez. Nada. Nem sinal. Nem barulho. Já vi essa história.
Bom, parece piada né? Coloco o cara no Troller e vamos até a fazenda. Desligo o carro para ver se liga de novo. Não liga. Telefonamos para o mecânico, que vem de Bodoquena e demora quase duas horas para chegar. Prega durex em um fio e cobra R$ 50. Uma fortuna, mas monopólio é isso mesmo. Pagamos e seguimos viagem. O carro vai bem até Bonito. Ficamos dois dias na cidade, que realmente faz jus ao nome.
Após Bonito, o destino era Dourados. Com pouco mais de meia hora na estrada, paramos para abastecer. Tanque cheio, ligo o carro. Nada. De novo. Nada. Outra vez. Nada. É inacreditável, pensei. Conseguimos ajuda e o carro pega no tranco. Dirigimos mais uma hora e o paramos para almoçar. O carro, obviamente, morre quando desligo. Após o almoço, nova ajuda e novo tranco. Dourados está perto, penso. Lá poderemos levar o carro ao mecânico.
Quando chegamos em Dourados, por volta das 13h30, a cidade parece deserta, todas as lojas estão fechadas. Perguntei à Jaqueline se ela achava possível a cidade parar durante o almoço. Ela respondeu: “com a sorte que temos, com certeza hoje é feriado por aqui”. E não é que ela estava certa? Era o dia da padroeira da cidade. Não funcionava nada. Muito menos oficina mecânica. Agora ferrou, pensei.
Liguei para a redação da Gazeta Mercantil em Brasília e expliquei a situação. Como tínhamos feito muitas matérias, poderíamos tirar Dourados do roteiro e ir direto a Campo Grande, onde passaríamos o carro para a próxima dupla de repórteres. Fomos direto, sem parar nenhuma vez. Ao chegar em Campo Grande, pegamos uma rua movimentada. A Jaqueline, que dirigia, deixou o carro morrer no sinal. Desci do carro e tento, a muito custo, empurrar o troller, que pesa bilhões de toneladas, rua acima. Sozinho, não consegui andar nem 50 metros. Parou um carro. Desceram dois homens que me ajudam a empurrar. Paramos no estacionamento de um supermercado. Dali direto para a oficina. Último tranco, últimos quilômetros no Troller. Dali para o hotel e para Brasília. E com uma bela história para contar aos outros.